O sol começava a brilhar, enquanto o ônibus 151 atravessa a cidade em direção à zona sul. A paisagem invernal está em sua época mais enfadonha: árvores despidas, ruas cobertas de folhas, carros enlameados.
O ônibus passa por lugares bonitos, históricos, mas os passageiros, envergando roupas pesadas, estão sentados, comprimidos uns contra os outros, embalados pelo ruído monótono do motor e pelo ar abafado, alheios a tudo o que se passa.
Apesar de encontrarem praticamente todos os dias as mesmas pessoas, ninguém conversa, afundando o olhar em algum jornal, ou perdido no horizonte.
Passado algum tempo, ouve-se subitamente uma voz:
– Atenção, atenção!
Os jornais se agitam, os pescoços entendem-se.
– Aqui quem fala é o motorista.
Silêncio total. Todos olham para frente. Sua voz é autoritária.
– Larguem os jornais!
Os jornais baixam lentamente, enquanto mecanicamente espera-se nova ordem.
– Agora, olhem para quem está sentado ao seu lado.
Surpreendentemente, todos obedecem instintivamente, como um rebanho, mas ninguém sorri.
– Agora repitam comigo: BOM DIA, VIZINHO!
As vozes soam fracas e tímidas. Para alguns era a primeira palavra pronunciada naquele dia. Todos são invadidos por uma sensação de alívio, afinal não é um assalto ou rapto e um sorriso se esboça em seus rostos. A barreira foi destruída. Depois do bom dia, alguns apertam as mãos, outros riem.
O motorista não diz mais nada – não é necessário. Ninguém mais recomeça a ler os jornais e todos conversam animadamente. Começam a abanar a cabeça e comentar: “que motorista maluco!”, alguns se lembram de outras histórias ocorridas noutras viagens do ônibus 151.
Enquanto alguns vão desembarcando em seus destinos, despedindo-se animadamente de seus vizinhos de banco, outros continuam o bate-papo e entram novos passageiros estranhando aquela balburdia gostosa no veículo.
Aquele motorista, com um gesto simples, melhorou o dia de muitas pessoas, pois aquela alegria também chegaria àqueles que teriam contato com os seus passageiros. Provocou de certa forma, inconscientemente, um milagre na segunda-feira de manhã.
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Algumas pessoas dizem não ter condições para ajudar alguém. Na maioria das vezes, não é necessário nada mais que uma palavra, um gesto, um pouco do tempo à disposição. À medida que cada um faz um pouco, contribui para o benefício de todos. Basta começar.
Adaptado da Revista Seleções Reader’s Digest de outubro de 1999.
Luis Roberto Scholl