Parábola dos Talentos


         O Senhor da Terra, partindo, em caráter temporário, para fora do mundo, chamou três dos seus servos e, considerando a capacidade de cada um, confiou-lhes alguns dos seus próprios bens, a título de empréstimo, participando-lhes que os reencontraria, mais tarde, na Vida Superior...

         Ao primeiro transmitiu o Dinheiro, o Poder, o Conforto, a Habilidade e o Prestígio: ao segundo concedeu a Inteligência e a Autoridade, e ao terceiro entregou o Conhecimento Espírita.

         Depois de longo tempo, os três servidores compareceram diante do Senhor para as contas necessárias.

         O primeiro avançou e disse:

         - Senhor, cometi muitos disparates e não consegui realizar-te a vontade, que determina o bem para todos os teus súditos, mas, com os cinco talentos que me puseste nas mãos, comecei a cultivar, pelo menos com pequeninos resultados, outros cinco, que são o Trabalho, o Progresso, a Amizade, a Esperança e a Gratidão, com alguns dos companheiros que ficaram no mundo... Perdoa-me, ó Divino Amigo, se não pude fazer mais!...

         O Senhor respondeu tranqüilo:

         - Bem está, servo fiel, pois não erraste por intenção... Volta ao campo terrestre e reinicia a obra interrompida, renascendo sob o amparo das afeições que ajuntaste.

         Veio o segundo e alegou:

         - Senhor, digna-te desculpar a incapacidade... Não te pude compreender claramente os desígnios que preceituam a felicidade igual para todas as criaturas e cometi lastimáveis enganos... Ainda assim, mobilizei os dois valores que me deste e, com eles, angariei outros dois que são a Cultura e a Experiência para muitos dos irmãos.

         O Excelso Benfeitor replicou, satisfeito:

         - Bem está, servo fiel, pois não erraste por intenção... Volta ao campo terrestre e reinicia a obra interrompida, renascendo sob o amparo das afeições que ajuntaste.

         O terceiro adiantou-se e explicou:

         - Senhor, devolvo-te o Conhecimento Espírita, intocado e puro, qual o recebi de Ti. O Conhecimento Espírita é Luz, Senhor, e, com ele, aprendi que a tua Lei é bastante justa, atribuindo a cada um conforme as próprias obras. De que modo usar a lâmpada assim, brilhante e viva, se os homens na Terra estão iludidos e cegos? Como empregar o clarão de tua verdade sem ferir ou incomodar? E como incomodar ou ferir, sem trazer deploráveis conseqüências para mim próprio? Sabes que a Verdade, entre os homens, cria problemas onde aparece... Em vista disso, tive medo de Tua Lei e julguei como sendo a medida mais razoável para mim o acomodar-me com o sossego de minha casa... Assim pensando, ocultei o dom que me recomendaste aplicar e restituo-te semelhante riqueza, sem o mínimo toque de minha parte!...

         O Sublime Credor, porém, entre austero e triste, ordenou que o tesouro do Conhecimento Espírita lhe fosse arrancado e entregue, de imediato, aos dois colaboradores diligentes que se encaminhariam para a Terra, de novo, declarando, incisivo:

         - Servo infiel, não existe para atua negligência outra alternativa senão a de recomeçares toda a tua obra do princípio...

         - Senhor!... Senhor!... - suplicou o servo displicente. - Deste aos meus companheiros o Dinheiro, o Poder, o Conforto, a Habilidade, o Prestígio, a Inteligência e a Autoridade, e a mim concedeste tão-só o Conhecimento Espírita... Como fazes cair sobre mim todo o peso de tua severidade?

         O Senhor, entretanto, explicou, brandamente:

         - Não desconheces que te atribuí à luz da Verdade como sendo o bem maior de todos. Se ambos os teus companheiros não acertaram em tudo, é que lhes faltava o discernimento que lhes podia ter ministrado, através do exemplo, de que fugiste por medo da responsabilidade de corrigir amando, trabalhando e instruindo... Escondendo a riqueza que te emprestei, não só te perdeste pelo temor de sofrer e auxiliar, como também prejudicaste a obra deficitária de teus irmãos, cujos dias no mundo teriam alcançado maior rendimento no Bem Eterno, se houvessem recebido o quinhão de amor e serviço, humildade e paciência que lhe negaste!...

         - Senhor!... Senhor!... porquê - soluçou o infeliz - porque tamanho rigor, se a tua Lei é de Misericórdia e Justiça.

         Então, os assessores do Senhor conduziram o servo desleal para o recomeço dos trabalhos, esclarecendo a ele que a Lei, realmente, é disciplina de Misericórdia e Justiça, mas com uma diferença: para os ignorantes do dever a Justiça chega pelo alvará da Misericórdia; mas, para as criaturas conscientes das próprias obrigações, a Misericórdia chega pelo cárcere da Justiça.

Fonte: XAVIER, F. C. Estante da Vida, pelo Espírito Irmão X. 3. ed., Rio de Janeiro, FEB, 1974. (íntegra do Capítulo IV). Com algumas modificações.