SOCORRO TARDIO


         Você já parou para pensar, algum dia, a respeito da caridade?

          De um modo geral, confundida com a esmola pura e simples, o dar para se ver livre do pobre, do pedinte, dar para que ele se vá, de uma vez.

          Face aos problemas da fome, da miséria, já não lhe ocorreu dizer: Isto é um problema do governo? Será mesmo?

          Afinal, quem, em que hora, quando e em que lugar deve praticar a caridade?

          Certa vez, no tempo dos czares, no Teatro de Moscou, foi representada uma peça muito célebre.

          Todas as dependências estavam totalmente tomadas pelos membros da realeza.

          O enredo girava em torno dos sofrimentos de um soberano místico que, em meio a cruéis padecimentos, sacrificou-se pela fé cristã.

          A música enlevava os corações da nobreza assistente. Todos se identificavam com as agonias cristãs da personagem que, de alguma forma, traduzia um pouco do íntimo de cada um.

          Quando findou o colorido espetáculo, à saída do Teatro, deitado sob a marquise, estava um mendigo.

          Tiritava de frio. Parecia que delirava em meio à nevasca da noite.

          Uma das damas da corte, ao descer as escadarias que a levariam à sua carruagem, movida por um natural impulso de bondade, retirou o rico casaco de peles que a agasalhava, e se encaminhou em direção ao pobre homem, com a firme intenção de o cobrir.

          A dama que lhe fazia companhia, porém, percebendo o que a outra iria fazer, a deteve.

          Não faças isso! De que adiantaria a esse miserável uma peça de vestuário de tal valor? Amanhã enviarás, por um dos teus servos, agasalhos quentes para ele.

          A dama do casaco de alto preço, movida agora por sentido utilitarista da vida, respondeu: Sim, tens razão. E tornou a vestir o casaco, buscando a carruagem.

          Chegaram ao luxuoso castelo, tomaram um chá quente e reconfortante e buscaram as camas aconchegantes.

          Esqueceram da agonia do desconhecido tombado sob a marquise gélida.

          No dia seguinte, despertando já manhã alta, a dama recordou-se do homem tiritante de frio.

          Chamou um de seus servos e ordenou que levasse agasalhos ao pobre homem.

          Quando lá chegou, o serviçal se deparou com o desconhecido já morto, sendo removido pela polícia.

* * *

          O fato responde aos questionamentos iniciais.

          Sempre que a caridade recebe a interferência de polêmicas, discussão, debate, invariavelmente o socorro chega atrasado.

          É necessário que cada um de nós faça o bem hoje. Há muitas formas de se praticar a caridade:

          Retirar alguém da escuridão do analfabetismo. Providenciar internamento devido a um doente sem recursos.

          Levar o remédio necessário ao que se encontra no leito. Propiciar o leite a uma criança cuja mãe já apresenta os seios vazios.

          Ofertar um brinquedo ao menino de rua, ao garoto sem pais, à criança que espera.

          Enfim, ser caridoso é fazer aos outros o que desejamos que os outros nos façam, tanto no aspecto material como no moral.

* * *

          As nossas posses de nada valerão se não tivermos no cofre do coração o pão da caridade e a palavra consoladora da misericórdia que nos compete distribuir.

          Dar do que nos sobra é dever de solidariedade, dar um tanto mais é doação plena.

Redação do Momento Espírita com base no cap. 9 do livro Moldando o terceiro milênio,
de Fernando Worm, ed. Leal e cap. 16 do livro Estudos espíritas, do Espírito Joanna de Ângelis,
psicografia de Divaldo Pereira Franco, ed. FEB. Em 01.02.2008