Naquele momento, Nestor estava extremamente desesperançado. Não bastavam os problemas financeiros e familiares, agora surgira nele uma grave doença de difícil tratamento. Se ele já não era muito religioso antes, agora deixara definitivamente de acreditar em Deus e em uma justiça maior.
Augusto, velho conhecido, há muito tempo tentava auxiliá-lo levando o consolo da Doutrina Espírita, procurando reanimá-lo, dando-lhe novas esperanças.
Nestor, refratário a qualquer informação no campo religioso, irônico, provocou seu amigo:
– Augusto! Eu só vou acreditar nos Espíritos e nesse ‘seu’ Espiritismo se vier um de seus amigos do mundo invisível para me curar dessa triste enfermidade que eu tenho. Isso é possível? – perguntou entre incrédulo e esperançoso.
– Impossível não é – respondeu o amigo. Mas é bastante improvável.
– Então não me venha falar de Deus e Espíritos protetores se eles não podem desfazer o mal que me apareceu.
– Espere um pouco. Deixa eu te explicar. O que você acha se hoje, no Supremo Tribunal Federal, os ministros decidissem que a partir de amanhã, todas as celas dos presídios e delegacias deveriam ser abertas e todos os encarcerados no Brasil estariam libertos de suas penas? O que poderia acontecer?
– Ora, os assassinos voltariam a cometer assassinatos; os ladrões voltariam a roubar; os corruptos estariam livres para corromper ainda mais… Seria o caos!
– Então, não pensa você que a prisão – apesar de todos os seus defeitos – além de ser uma proteção para a sociedade, também é uma proteção ao indivíduo infrator, para que ele não se comprometa ainda mais frente a justiça, cometendo novos crimes?
– É verdade. Eu nunca tinha pensado no encarceramento do criminoso por esse ângulo. Eu só acreditava que era um castigo pela sua má conduta. Desta forma vejo que é um benefício para ele também, pois o impede de realizar ações que aumentariam ainda mais os seus débitos frente à sociedade.
– Agora pense na enfermidade sob este mesmo ângulo. Temos certeza de que a doença não surge ao acaso. Está diretamente relacionada a infrações da lei divina ou a situações de resgate e aprendizados. A doença, muitas vezes, funciona como o presídio para o criminoso: impede ou dificulta ao indivíduo que ele continue a seguir por caminhos tortuosos e errôneos pelas estradas da vida.
Veja você mesmo, Nestor, como exemplo. Sem querer julgá-lo, perceba que a sua enfermidade é o resultado de muitos anos de consumo de bebidas alcoólicas, de uma vida desregrada, sem controle. Se a doença não surgisse nesta hora da sua vida, provavelmente você continuaria a se comprometer ainda mais, não só moralmente, mas também dificultando a convivência familiar e sua situação financeira. Continuaria a ter uma vida sem objetivos maiores, sem uma finalidade útil. Com o surgimento da enfermidade, a sua liberdade foi limitada, porque você abusou do seu livre arbítrio. Ela também serve para momentos de reflexão e escolhas para novos rumos. Quando não encontramos causa direta da moléstia nesta existência, ela estará nas existências pregressas, pois Deus é justo e não propõe nenhuma injustiça aos seus filhos. Aí encontramos a explicação para o nascimento de crianças com graves comprometimentos físicos e mentais.
– Sabe que o que você disse tem certo sentido – refletiu Nestor. Parando para pensar, todas estas dificuldades que eu tenho passado são resultados de minhas próprias atitudes. Com a doença, eu percebi que comecei a me questionar mais profundamente sobre a minha vida, minhas atitudes, a minha família, os meus objetivos…
– O objetivo maior dos sofrimentos não é castigar quem errou, mas fazer com que ele pare, reflita nos seus equívocos e mude o rumo da sua jornada. E, quanto a cura que você mencionou, seria como a liberdade ao criminoso: quando já estiver resgatado os débitos frente as leis divinas. Quando já tiver aprendido a lição, ela surge, algumas vezes de forma natural, outras através da própria medicina terrena – que também está a serviço de Deus e dos bons Espíritos. Mas, um alerta: é como a liberdade provisória – não voltes a errar para que a dor não venha novamente bater a sua porta. Foi Jesus quem disse: “Não voltes a pecar para que algo de pior não te aconteça.”
Luis Roberto Scholl