“Um rei muito antigo, enviou seu bufão numa excursão a outros reinos: – Vá para o estrangeiro – disse ele – e veja tudo que existe para ser visto. Leve com você esta vara de ouro e, se encontrar um tolo maior que você, dê-lhe de presente.
Após os preparativos, o fiel servidor partiu em viagem. Depois de um período de ausência, ao voltar, o bobo da corte encontrou o rei gravemente enfermo, a beira da morte.
– Eu também vou fazer uma longa jornada anunciou o rei. Uma jornada ainda mais longa que a sua.
– Todos os seus preparativos estão feitos? – perguntou-lhe entristecido o bufão.
– Não – respondeu o rei. Não fiz preparativo algum.
– Então – disse-lhe o saltimbanco – é ao senhor que devo dar a vara de ouro, pois somente um tolo maior não se prepara para a jornada que é inevitável.”
Age-se com insensatez quando não se procura compreender e preparar-se para a experiência da morte a qual, mais cedo ou mais tarde, todos passarão. Não se trata de viver preocupado com ela, mas de viver de modo que, quando ela venha, não precise se sentir perdido, angustiado, desamparado, despreparado.
O medo da morte, muitas vezes, deve-se a atitudes relacionadas à vida: para o niilista (materialista), que busca os prazeres materiais e mundanos, sem um objetivo maior para a existência, a simples percepção do nada absoluto após a morte, é motivo de temor. O medo da não existência, do vazio, é um espectro que, inconscientemente, atormenta sua vida “alegre”. Para o dogmático, que admite a unicidade das existências, para quem o destino estará definitivamente traçado na alegria ou no desespero eternos, a morte pode se tornar fonte de tormentos, pois, tem-se a consciência de que, poucos são aptos a habitarem o “paraíso dos eleitos”, porque todos possuem deficiências morais que devem ser corrigidas. Para os adeptos da teoria reencarnacionista, a morte é encarada com mais serenidade: é uma passagem cíclica do espírito da dimensão material para a espiritual e vice-versa, até a suprema purificação do indivíduo. Na Doutrina Espírita, a compreensão da desencarnação como o fim de uma etapa e princípio de outra e, sobretudo, a continuidade da jornada individual, desmistifica a experiência da morte, tornando-a, como deve ser, um fato natural na vida orgânica.
Quanto maior preparação durante a encarnação, mais tranqüila será a “viagem”. O desapego material, o abandono do orgulho, a substituição do egoísmo e da vaidade pela caridade e benevolência, a retidão no pensar e no agir devem fazer parte da transformação moral de cada um, para que se possa dizer como João XXIII afirmou: “- As minhas malas estão prontas. Posso partir a qualquer momento”.
Podemos trabalhar para pensar do mesmo jeito.
Luis Roberto Scholl