Por que amar o próximo?

O ser humano sempre foi muito prático e dinâmico quando estão em jogo os seus interesses e o próprio bem-estar. As conquistas, mesmo as mais grandiosas foram, na maioria das vezes, motivadas pelo interesse pessoal, visando o reconhecimento, a fama, a fortuna, enfim, pela satisfação pessoal.

O interesse pessoal e o apego às coisas materiais (dentre elas fama, poder, dinheiro, status) são, na visão dos Espíritos superiores, características marcantes de imperfeição e inferioridade moral, conforme resposta à questão 895 de O Livro dos Espíritos1. Com certeza, assim na Terra, se constitui a grande maioria dos Espíritos encarnados.

Frente à dúvida do agir ou não agir, a pergunta que muitos se fazem é: O que eu vou ganhar com isso? Se não há nenhum ganho pessoal (material ou “espiritual”) provavelmente não se move, nem tenta atuar em direção ao próximo, à coletividade ou ao progresso.

Neste contexto, a afirmativa de Jesus que devemos amar o nosso próximo parece utópica e fora da realidade. Porque amá-lo se isso é tão difícil? Se ele me incomoda? Se, aparentemente, é mais fácil eu me isolar e pensar só em mim? Se isso é contra a minha natureza? Se não me trará nenhum benefício?

O professor Jerri Roberto Almeida, no excelente livro A Convivência na Casa Espírita2, trouxe-nos possíveis respostas que tentaram esclarecer a humanidade na afirmativa de Jesus (p.107):
Moralista: devemos amar para sermos vistos, pelos outros como pessoas boas;
Dogmática: devemos amar porque Deus assim quer e as religiões ensinam;
Paternalista: devemos amar para que Deus nos veja como bons filhos e nos conceda benefícios.

O autor afirma que (p.108): Essas concepções, se no passado de alguma forma refrearam os instintos humanos, atualmente não mais o fazem. Isto pelo fato de estarmos em um contexto mental diferente.

No mundo contemporâneo, onde a inteligência se desenvolveu de forma extraordinária, os aspectos da racionalidade ganharam enorme importância, mas, ao mesmo tempo, o desenvolvimento moral ainda é comparativamente pequeno. O preceito de “amar ao próximo” deve ter uma conotação mais lógica e prática, mesmo que ainda procure atender aos interesses pessoais.

Quando se estuda nas áreas da psicologia, da medicina, da filosofia uma abordagem sobre a qualidade de vida das pessoas, não só no aspecto físico, mas também nos mental e psicológico, o tema convivência saudável e relacionamentos humanos é fundamental e indispensável. Observa-se através de estudos que é impossível ao indivíduo uma vida equilibrada e com qualidade se os seus relacionamentos interpessoais são desarmônicos e perturbados. Todas as alternativas que se buscou para substituir o convívio social – o isolamento, as fugas pelos prazeres fúteis, pelos tóxicos, álcool, a indiferença, o confronto – demonstraram-se ineficazes e profundamente traumáticas, trazendo prejuízos de grandes proporções ao indivíduo e à sociedade.

Então, como conviver com o próximo para termos uma boa qualidade de vida?

Jesus, o psicoterapeuta por excelência, profundo conhecedor da alma humana deu a receita para uma vida feliz, com qualidade e convivência harmoniosa: amar o próximo como a si mesmo. Sendo o amor uma lei natural, sempre que se contraria esta lei, posiciona-se em estado de desequilíbrio.

São Vicente de Paulo (q. 888 a)3afirma: Amai-vos uns aos outros, eis toda a lei. Lei divina pela qual Deus governa os mundos. O amor é lei de atração para os seres vivos e orgânicos; a atração é lei de amor para a matéria inorgânica.

Quando a lei de amor estiver inserida no ser humano ele, efetivamente, praticará a mais merecedora das virtudes que nasce da mais desinteressada caridade. (q. 893)4. Mesmo que o aprendizado do amor ao próximo seja mais por interesses pessoais (qualidade de vida, convivência pacífica), este são passos iniciais a serem percorrido por todos.

Essas mudanças, obviamente, são gradativas e ocorrem a partir do nível mental para o comportamental. Permeando as várias fases desse processo está a educação dos sentidos, instintos e sentimentos, explica Jerri Almeida5.

Portanto, a felicidade que a humanidade buscou em todos os cantos da Terra e do céu está na mensagem simples e profunda do mestre Jesus e só a encontraremos quando a vivenciarmos em plenitude. Amar o próximo, compreendê-lo nas suas dificuldades, ser indulgente com seus equívocos, tolerar as suas imperfeições, auxiliá-lo nas suas dificuldades é praticar a caridade e conquistar a paz de consciência. Mesmo porque nós necessitamos que os outros também tenham estas virtudes em relação a nós.

Luis Roberto Scholl
1, 3, 4KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Edição Especial – Rio de Janeiro: FEB, 2007.
2, 5ALMEIDA, Jerri Roberto. A Convivência na Casa Espírita. Porto Alegre: Francisco Spinelli, 2011.